Agora que sou uma cardíaca farense, fiz o que tinha de ser feito – ir a um médico em Lisboa. Como estou a acumular as doenças, a gripe intensa que me assola cumpriu a incumbência de me pôr a dormir durante as três horas das viagens de ida e volta proporcionando-me o relaxamento necessário para a minha missão.
Não se pense que a preocupação sobre o meu estado é inexistente, mas isto de frequentar um hospital coladinho ao Colombo é capaz de despoletar a réstia de bem-estar que ainda existe dentro de mim. Como missões, levava a de comprar um Homem-Aranha com um cupão Continente e de dar uma volta pelas lojas com o intuito de ir bisbilhotar a nova coleção de sapatos de Cristina Ferreira (que por mais incrível que possa parecer, é linda de morrer e parece que grita por mim a uma cadência que se vai majorando à medida que o tempo passa).
Mas entre as idas às lojas, lá fui à consulta onde por várias vezes me foi dito “arritmia benigna”. Não é que eu achasse que ela seria maligna (=mortífera) mas confesso que a ideia de simplesmente o meu coração deixar de bater e eu morrer em agonia, era algo que pontualmente surgia como se uma picada de mosquito se tratasse. Assim que todo o potencial perigo foi afastado da minha mente, as informações a reter passaram a ser outras. Coisas como “mas aqui só há silêncio!”, ou “uau, que consultório com tanta luz!” ou ainda “porque é que o médico me está apresentar as assistentes administrativas??!!” passaram a romantizar toda a minha cardiopatia.
Mas como em qualquer fantasia narrativa que capte a atenção do leitor é imperativo que o amor ande lado a lado com o ódio e a vingança, não serei eu a quebrar esse elo. Por essa razão coisas como “tem de comunicar ao Infarmed que teve alucinações com o genérico” ou “entra na urgência com queixas cardíacas, confirmadas por ECG e não há nenhum cardiologista do HDF que a vá ver??!!” vão resultar em dois textos, que acredito magníficos, mas que infelizmente serão lidos apenas por um público muito selecionado que os irá desprezar logo de imediato.
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