
Assim que se ouviram, ainda que ao longe, as palavras “choque” e “tecnológico” tratei logo de arranjar um computador portátil e contribuir para tão ambicioso plano, embora que ainda de uma forma muito modesta: neguei-me ao pagamento de algumas facturas de operadoras que disponibilizavam o acesso portátil à Internet explicando-lhes detalhadamente quantos bytes correspondiam a um gigabyte, explorei intensamente as redes peer-to-peer, desenvolvi rotinas de busca de ligações sem fios não protegidas na minha área de residência e empenhei-me em ver todos os episódios do House e do Prison Break antes de passarem em Portugal.
Hoje, mais de dois anos depois de anunciado, continuo com o mesmo entusiasmo a defender tão inovadoras ideias e a aplicá-las no dia a dia. Por tudo isto regozijei-me pelo aparecimento de um outro Plano Tecnológico de menor abrangência, mas não de menor ambição – o Plano Tecnológico da Educação. De acordo com o seu texto o objectivo é “colocar Portugal entre os cinco países Europeus mais avançados ao nível de modernização tecnológica do ensino” e para tal várias medidas serão levadas a cabo como o tão fantástico kit tecnológico (310 000 computadores, 9 000 quadros interactivos (QI) e 25 000 videoprojectores que equiparão as escolas até 2010).
Como sou uma pessoa com iniciativa resolvi frequentar uma acção de formação sobre a utilização dos já referidos QI para produção de materiais didácticos. Inscrevi-me e não pensei mais no assunto, até que na véspera da primeira sessão, recebo vários sms’s de amigos muito felizes por estarmos todos inscritos na mesma acção e de se estar a pensar em transformar a 1ª sessão numa espécie de “Party Zone”…
Lá cheguei no dia combinado e realmente foi muito bom. Encontrei quem não via há muito tempo e conversei como se não houvesse dia de amanhã. Também prestei atenção ao formador (um grande apreciador das imagens do clip-art do software que exemplificava) e fiquei entusiasmada com as maravilhas que ele me mostrava, ausentes de qualquer desvantagem. No final da sessão foi proposto como trabalho de casa, a elaboração de um texto sobre a nossa experiência QI. Em virtude de não ter acesso a estes equipamentos propus-me, logo ali, a escrever um texto sobre um outro tema qualquer à escolha, algo que foi imediatamente rejeitado pelo formador, dando-me a indicação de que deveria procurar um QI e relatar a primeira experiência que tiver com ele.
Menos de 24 horas depois, a ordem natural das coisas a que chamamos destino fez o seu papel e eu entro numa sala de aula de uma comum escola, e vejo preso a uma parede um QI muito branquinho. Nesse instante o tempo parou e senti-me impelida a acariciá-lo, a tocar-lhe nas canetas, a percorrer com os meus dedos a sua moldura preta e até a sorrir; tinha compreendido a expressão de êxtase absoluto manifestada pelo formador na tarde anterior – o QI era lindo e nada mais interessava no mundo!
Mas como isto do devir é uma realidade, depressa a contagem do tempo recomeçou e dei por mim a observar a sala onde me encontrava: existiam as singelas cortinas brancas de pano nas janelas, o quadro de parede era o protagonista da sala, o giz causava-me alergia, o apagador era mais velhinho do que se possa imaginar, os mapas estavam amontoados a um canto e a reciclagem de papel não era ainda uma realidade. Acabara de sofrer um salto temporal e estava no passado!