A forma como enfrento o meu avanço etário e as transformações que vão ocorrendo no meu corpo tem sido serena pois já não me preocupam coisas como os cabelos brancos, muitos cabelos brancos que tenho, a gordura instalada antes da plenitude da idade adulta ou a ruga (muito bem hidratada com óleo de rosa mosqueta) que brotou recentemente.
De entre estas transformações existe uma que tem sindo muito bem-vinda, embora não tenha a certeza que ela tenha sido uma natural evolução do meu organismo. Falo dos pelos, dos indesejáveis claro, que desde cedo depressa invadiram o meu corpo. Com o passar dos anos, esta cobertura pilosa foi desaparecendo, quer porque as sessões de depilação definitiva acabaram com ela, quer porque a sua erradicação natural está sendo orquestrada pelas minhas hormonas ou simplesmente porque já não quero saber nada dessas presenças inestéticas que quebram a harmonia das minhas toilletes mais reveladoras.
Ainda me lembro de quando era parecida com a Madonna e tentava a todo o custo depilar as minhas fartas axilas, ora com cera, ora com a boa da gillete. Também ainda recordo com algum detalhe as borbulhas das virilhas deixadas pelo rebentar dos pelos grossos e negros que teimavam em vir sempre conhecer a luz do Sol ou a ponte entre as duas sobrancelhas que embora ténue, incomodava como se não o fosse.
Sinto-me feliz com o facto de, agora depois dos 40 anos, já nada disso me incomodar e auguro pela chegada dos 50 anos altura em que o incómodo já não existirá pois terá sido substituído pelo relaxo total, sinónimo de moda naturalista que abraçarei de alma e coração.
No passado, imaginei neste dia de São Valentim um mundo repleto de fantasia em que todos seríamos peões de uma realidade sublime, plena de beleza, encantando todos com quem nos cruzássemos e inspirando qualquer ser, independentemente da sua natureza. Concebo que cada um de nós, durante esse dia, fosse capaz de pronunciar palavras com um timbre capaz de inebriar os anjos, uma altura capaz de emocionar os passarinhos e uma intensidade capaz de desencadear uma harmonia impossível de descrever. Durante essas fantásticas 24 horas, o movimento dos planetas deixaria de ser importante, a Lei da Gravitação Universal deixaria de comandar os nossos movimentos e todos flutuariam num éter pleno de maravilha.
Hoje, volvidos 365 dias, considero com grande pena minha, que a poesia embebe a existência de alguns que travam esta batalha da sobrevivência mas que me exclui de forma violenta de mais esta demanda do Universo.
Falo em concreto das profissionais de medicina plenas de beleza com pernas suaves e sem vestígio de pelo que de certeza encantam todos os que com elas se cruzam. Tenho a certeza que desde 2009, altura em que foi pela primeira vez detetada a burla, que de voz fininha e sussurrada lá iam contando às amigas que agora “se estavam a livrar dos pelos”. Era assim como se fosse uma coisa higiénica. E lá iam estes murmúrios ecoando pelos corredores do Hospital de São João do Porto, assim como se de piares harmoniosos se tratassem.
Uma coisa puxa a outra, e outra e outra e de repente esta nova maravilhosa descoberta levava a uma outra tão mais importante do que a Lei da Gravitação Universal – afinal era possível fazer este tão caro processo de depilação com comparticipação pela ADSE. Sim, era um benefício de apenas aqueles que trabalham para o estado, mas isso não interessava assim tanto. O importante é que os pack’s de depilação a laser podiam ser considerados atos médicos equivalentes a consultas de dermatologia; afinal estava-se a eliminar esse mal que era o pelo.
Sim, durante algum tempo, essas senhoras flutuaram num éter pleno de maravilha em que as suas axilas, perninhas, púbis “todas limpinhas” comandavam um cérebro determinado, confiantes de que afinal aquilo que faziam nem seria uma burla mas apenas um corte nas despesas em sentido inverso!
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