
Nunca gostei particularmente de rock e por essa razão, da minha adolescência não são os U2, os Simple Mind ou os Pink Floyd que recordo. Quem me fazia vibrar nesses tempos era mesmo o Michael Jackson, principalmente durante todo o período de reinado do seu álbum Thriller. Os anos foram passando, os meus gostos musicais foram migrando para outras sonoridades e o Michael Jackson passou a estar longe das minhas preferências musicais.
Mas da mesma forma como recordamos sempre um antigo amor com algum carinho, confesso que sempre que nas aulas de hip-hop o instrutor (um recém-trintão, esse sim grande fã do artista) nos obrigava a fazer o aquecimento ao som de algum dos seus sucessos, eu vibrava de forma intensa e recordava aquele que porventura terá sido a minha primeira paixão platónica por um artista do mundo das canções.
Hoje, já algumas décadas depois, o efeito causado por essa personagem que se intitula Michael Jackson não pode estar mais longe do enamoramento que senti. Se a sua música já não me desperta sensações de prazer, então a sua imagem desencadeia em mim uma série de emoções que começam na repulsa, passam pelo espanto e cepticismo e culminam com a admiração total por quem fabricou aquela cara. Quando vi as suas últimas imagens foi-me impossível esquecê-las tal era a artificialidade de tudo aquilo: a peruca de cabelos negros, fartos e hiper-brilhantes; o nariz consentâneo com o boato de que ele usará uma prótese nesse apêndice; a impossibilidade de lhe ver nem que fosse 1 mm2 de pele em virtude de esta se encontrar totalmente coberta por qualquer coisa que devido ao meu insuficiente vocabulário vou chamar de maquilhagem; os lábios carnudos resultado indubitável de injecções de silicone ou qualquer outro sucedâneo; a “covinha” do queixo que há muito já deixou de o ser e que agora não passa de uma “bifurcação”... Mas de tudo, o que mais me impressionou foi mesmo a face inexpressiva, apesar do sorriso aberto que insistiu em mostrar por várias vezes.
Como sei que as estrelas deste nível de popularidade são geradoras de tendências e que ao mesmo tempo são pouco mais do que joguetes de uma estrutura complexa especializada em “ganhar dinheiro”, depressa percebi que teria de haver algo por detrás daquela imagem. Claro que sendo eu, uma especialista na ciência que estuda os fenómenos aparentemente desconexos, rapidamente encontrei a explicação para tudo isto. O Michael Jackson passou a ser um “emoticon” (=emoção+ícone), uma forma de comunicação paralinguística muito utilizada actualmente na escrita de mensagens. Substitui-se uma verdadeira emoção por um boneco que corresponde a uma sequência de caracteres e cujo exemplo mais conhecido é o “smiley”.
Não faço ideia de quais os caracteres tipográficos a que corresponde Michael Jackson, nem sequer a que emoção pretende colar-se, mas como da sua voz não são os adjectivos bela, harmoniosa ou sequer melodiosa que a podem caracterizar e como da sua expressão corporal só percebemos que frequentemente sente um desconforto muito grande que o leva a apertar os testículos e a pedir ajuda levantando o outro braço, de certeza que não será o “smiley” o ícone a que corresponde.