Terça-feira, 1 de Julho de 2014

Diário de uma cardíaca (6)... ou a chave da vida

 

Gosto de levar o puto ao infantário já equipada para correr.  Aproveito a caminhada como aquecimento ligeiro e encho-me de deleite quando oiço o miúdo de dois anos perguntar-me se estou a usar o relógio da ginástica (dispositivo mágico caríssimo oferecido pela cara metade, que a partir do meu pulso debita informações como a frequência cardíaca e o local onde me encontro; esta última informação muito importante para quem comigo divide cama e mesa).  É uma realidade que o esforço despendido na atividade da corrida é tremendo, mas cada vez mais penso em continuar e em melhorar as minhas marcas (ontem baixei de 8 min/km para 7 min/km e foi muito bom).

 

Enquanto corro só me lembro do que li algures há muito tempo, talvez décadas  - Will Smith considera que a chave da vida é correr e ler.  A corrida ensina-nos a não desistir e a leitura ensina-nos a aprender com a experiência dos outros.  Durante a maior parte da minha vida só pratiquei a segunda opção, começo agora com a primeira.  O entusiasmo tem sido crescente e o bem estar proporcionado por esta atividade matinal é viciante.  E mais do que tudo, o facto de se aproximar mais uma reavaliação da minha condição cardíaca ainda torna tudo isto mais importante.

 

Também penso muito no Haruki Murakami e no seu auto retrato enquanto corredor de fundo e também eu consigo ter uma imagem de mim enquanto animal em esforço em que mais nada interessa, ou melhor, quase mais nada interessa. Faço aqui esta ressalva porque a realidade farense leva-me a estar de olho no bairro degradado que circundo nesta minha prática matinal e na comunidade cigana que o embebe.  Se de início a segurança era a minha principal preocupação, agora é mais o descortinar de coisas estranhas que acontecem como a existência de dois grupos, um de mulheres e crianças e outro de homens, que contemplam a ria e que não estabelecem contactos entre si que ocupa parte do meu cérebro. A outra parte ocupa-se em acreditar que qualquer um dos outros frequentadores desportistas com quem me cruzo me encare como uma verdadeira desportista capaz de alcançar as marcas mais incríveis de sempre.

 

publicado por Veruska às 13:59

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Sexta-feira, 21 de Fevereiro de 2014

O fanico... ou mais uma aventura murakamiana

 

 

Desde que tive o fanico que a minha vida não mudou. Tem sido exatamente igual à vida que tive antes de ter o fanico. Continuo a acordar à mesma hora, a fazer as minhas refeições da forma que sempre fiz e a transformar o meu tempo ocioso de forma constante sem grandes modificações.

 

Com o fanico, não veio a serenidade e nem a ansiedade. Simplesmente tudo continuou da mesma forma que sempre foi.  É certo que durante o fanico não sabia o que me estava a acontecer. Primeiro fiquei interrogativa sobre os sintomas, depois fiquei receosa com o prolongar da situação e por fim fiquei chorosa com o intensificar da condição.

 

Com o fanico, não me preocupei com ninguém, nem achei que poderia ser ali o meu fim ou início de algo realmente preocupante. Também não curti com a viagem de INEM de sirene ligada pelas ruas de Faro, pois o paramédico insistia em conversar comigo sobre alimentação, exercício físico, hábitos saudáveis e até sobre o novo nome da rua onde moro.

 

Com o fanico também não fiquei mais permissiva às coisas que me rodeiam, arranjando desculpas para aquilo que corre mal.  Irritei-me ligeiramente com o segurança que me viu chegar ao Hospital de mala chique pendurada no antebraço e pensou que eu fosse acompanhante de um qualquer doente e que só depois de ver que me colocavam pulseira laranja é que percebeu que eu estava mesmo a ter um fanico. Também não gostei de ter de ir pedir a minha medicação depois de uma espera que considerei longa e que estaria a levar ao início de novo fanico.

 

Mas com o fanico gostei de uma nova coisa – a de estar mais de uma hora à espera de realizar exames médicos. Esta delonga foi amortizada com a leitura de mais um livro de Haruki Murakami (só mais um de entre tantos que já lí; quase todos acho) – O Sono. Foi aí que percebi que mais uma vez o universo murakamiano resolveu invadir o veruskiano.  Tal como n’O Sono onde na realidade nada acontece a não ser a leitura de Anna Karenina, também na história do meu fanico a única coisa relevante foi mesmo a leitura de um conto.

 

Se no final d’O Sono tudo se conjuga para mais um final “à Murakami” onde não se encontram respostas e ainda surgem mais questões, também no final de toda esta minha história, auguro e anseio, por uma resolução/explicação do fanico “à Murakami”- uns bichos imaginários, e talvez malucos, entraram no meu coração maravilhoso e resolveram espicaçá-lo para que eu saísse do torpor dos últimos tempos.

publicado por Veruska às 16:38

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Segunda-feira, 18 de Março de 2013

Afinal não há grandes coisas insólitas... ou finalmente terminei a trilogia do 1Q84

 

 

 

Finalmente acabei o 1Q84. Gostei, gostei muito, mas não o amei de paixão como os anteriores livros do Haruki Murakami.  Talvez por ser demasiado longo, talvez por ter demorado muito tempo a lê-lo (especialmente o terceiro volume) ou mesmo talvez por não ser tão original e tão bom como os anteriores.

 

Depois de duas luas no céu, polícias com armas demasiado ameaçadoras e amores entre personagens que não se viam há anos e até uma gravidez concebida “sem pecado” tudo volta a uma aparente normalidade. Quem ama pode viver esse amor, o Povo Pequeno foi deixado para trás e o passado negro pode ser obliterado para sempre e nem sequer crisálidas de ar voltarão a ser tecidas.

 

Afinal coisas insólitas não existem!

publicado por Veruska às 21:15

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Terça-feira, 29 de Maio de 2012

Coisas insólitas (II)... ou como não sou a única a viver dentro de um livro do Murakami

 

O meu fascínio pelo Japão começou em menina. Nessa altura, a cultura japonesa era praticamente uma incógnita para os portugueses acabadinhos de sair de um período de “cegueira”, mas não sei bem explicar porquê, a vontade de conhecer o que se passava por lá, ia crescendo devagarinho dentro de mim.

 

Não se tratava de uma paixão exacerbada mas sim de um amor construído de forma lenta e sólida. Queria andar pelas ruas de Tóquio, visitar templos, jogar pachinko e tentar compreender como é que aquele povo gostava tanto de Manga.

 

Depois vieram as leituras. Comecei com Yukio Mishima, seguiu-se Kenzaburo Oe e por fim o maior de todos, Haruki Murakami. Deste último já li quase tudo. Comecei com Sputnik, Meu Amor, escolhido de entre vários na prateleira porque estava mal de amores e precisava de carpir a minha dor…Seguiram-se muitos outros, Norwegian Wood, Em Busca do Carneiro Selvagem, Kafka À Beira-Mar (um dos livros do meu Top 3), Crónica do Pássaro de Corda, Auto-Retrato do Escritor Como Corredor de Fundo, etc., etc.

 

Neste momento estou prestes a acabar o 2º volume de 1Q84 e apesar de, para mim, nem tudo neste livro ser irrepreensível, é com alegria que me congratulo que o universo fantasioso de Murakami invadiu já a sociedade e a política portuguesas.  Nesta obra, um dos protagonistas é um professor de Matemática que acumula com a profissão de ghostwriter escrevendo um livro que se torna num grande sucesso, ganhando um prémio e atingido vendas muito elevadas.

 

Em Portugal existe já pelo menos uma empresa a oferecer este serviço – a Culture Print. De acordo com esta notícia, a empresa oferece os seus préstimos de escrita de livros, blogues e discursos a quem tenha dificuldade em exprimir-se por palavras.

 

Julgo que o último cliente a solicitar este tipo de serviços terá sido o Serviço Nacional de Saúde, pedindo-lhes que redigissem a missiva que está a chegar a alguns laboratórios farmacêuticos, “exigindo perdões significativos da dívida em atraso, em troca do fornecimento de medicamentos e diagnósticos in vitro, para avançarem com o seu pagamento”.

 

         Não há dúvida que o estilo de Murakami está lá (a “fantasia” da proposta encontrada para se resolverem as dívidas e a “solidão” intuída para quem não embarque nesta solução), embora fique um pouco aquém do original. Não sei se será um best-seller.


publicado por Veruska às 15:05

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Domingo, 18 de Março de 2012

Coisas insólitas...ou como vivo dentro de um livro do Murakami

 

 

   Se a maturidade me levou a alcançar novas etapas na minha vida, a maternidade que lhe sucedeu também muito tem contribuido para tal.

 

   Depois de um período mais conturbado marcado pela adaptação a novas regras, horários e rotinas, recomecei lentamente a recuperar a minha vida pré-maternidade. Todos me avisam que tal seria impossível; jamais voltaria a ter tempo disponível para mim, os afazeres multiplicar-se-iam, o bebé necessitaria de mim em permanência e sobretudo os meus interesses pessoais iriam alterar-se radicalmente e jamais voltaria a ser a pessoa que fui durante os meus primeiros 40 anos de existência.

 

   Quase quatro meses volvidos sobre o nascimento do meu filho e enquanto ele chora e grita na espreguiçadeira que está ao meu lado, reflicto sobre as reais mudanças que me envolvem e mais uma vez encontro paralelo com um mundo que desafia as supostas leis do real.

 

   No mundo real, em tempo de crise, quem trabalha quer manter o seu emprego. O rendimento mensal é precioso e por isso há que ser profissional, trabalhar com afinco e prestar serviços de forma competente. Num mundo surreal, os estabelecimentos comerciais situados em localidades à beira-mar com esplanadas de sonho levam clientes a esperar mais de 2 horas para lhe serem servidos hamburgueres, servem refeições antes dos talheres estarem na mesa ou levam mais de 10 minutos a discutir qual será o troco correcto a devolver ao cliente.

 

   No mundo real, a segurança é uma preocupação. Viver de modo tranquilo e sereno é um objectivo almejado por todos e as expectativas colocadas nas forças de segurança são enormes. Num mundo surreal, os polícias “micam” mães ocupadas a colocar a cadeira do bebé recém-nascido dentro do carro e quase multam uma mãe por transportar um bebé em cadeira homologada no banco da retaguarda virado para trás, em vez de o fazer no banco da frente (em carro com ABS ligado) e virado também para frente.

 

   Num mundo real a liberdade é um bem precioso. A independência do ser humano catalisa um sem número de acções que causam satisfação e a sua ausência é por todos compreendida e alvo de constestação.  Num mundo surreal, quem quer atestar um depósito de combustível tem de fornecer um cartão com a identificação à operadora de caixa do posto de abastecimento ou pedir a um acompanhante que permaneça junto da caixa enquanto abastece.

 

Esta noite vou olhar o céu com atenção; talvez encontre a segunda Lua de que Murakami fala.

publicado por Veruska às 17:21

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